coisas que achamos quando perdemos
Sobre Fascismo Potencial
“(...) Há um ódio barato vigente em nossa cultura. Ele é programado em direção aos pobres, aos tachados de loucos, às prostitutas, aos travestis, aos grupos de adolescentes que se vestem de modo inusitado ou pertencem a uma tribo que não a das roupas de marcas sempre aceitas e dos comportamentos estandartizados. Digo “ódio barato” porque é fácil de sentir e dirige-se a quem é marcado como descartável pelo sistema econômico, social e político. Ele se refere à todos aqueles que não se encaixam também no econômico sistema mental de explicações pré-estabelecidas ao qual o fascista serve. (...)”
Para ler o artigo completo da filósofa e escritora Márcia Tiburi, acesse:
O silêncio como linguagem
Sobre vida e tempo
"O tempo é irrealizável. Provisoriamente, o tempo parou pra mim. Provisoriamente. Mas eu não ignoro as ameaças que o futuro encerra, como também não ignoro que é o meu passado que define a minha abertura para o futuro. O meu passado é a referência que me projeta e que eu devo ultrapassar. Portanto, ao meu passado eu devo o meu saber e a minha ignorância, as minhas necessidades, as minhas relações, a minha cultura e o meu corpo. Que espaço o meu passado deixa pra minha liberdade hoje? Não sou escrava dele. O que eu sempre quis foi comunicar da maneira mais direta o sabor da minha vida, unicamente o sabor da minha vida. Acho que eu consegui fazê-lo; (...) Não desejei nem desejo nada mais do que viver sem tempos mortos."
A transgressão do pensar
Lógicas exibicionistas
Na era atual, fico com a sensação de que solidão, amor, afeto, os sentimentos de modo geral, foram transformados em mercadoria e, ao adquirirem tal forma, tornam-se capital necessário a aquisição de status, imagem e, porque não, miragem?!
Fragmentos de aprendizagens
“— E então você não quis mais nada disso. E parou com a possibilidade de dor, o que nunca se faz impunemente. Apenas parou e nada encontrou além disso. Eu não digo que eu tenha muito, mas tenho ainda a procura intensa e uma esperança violenta. Não esta sua voz baixa e doce. E eu não choro, se for preciso um dia eu grito, Lóri. Estou em plena luta e muito mais perto do que se chama de pobre vitória humana do que você, mas é vitória. (...) Nós ainda somos moços, podemos perder algum tempo sem perder a vida inteira. Mas olhe para todos ao seu redor e veja o que temos feito de nós e a isso considerado vitória nossa de cada dia. Não temos amado, acima de todas as coisas. Não temos aceito o que não se entende porque não queremos passar por tolos. Temos amontoado coisas e seguranças por não nos termos um ao outro. Não temos nenhuma alegria que já não tenha sido catalogada. Temos construído catedrais, e ficado do lado de fora pois as catedrais que nós mesmos construímos, tememos que sejam armadilhas. Não nos temos entregue a nós mesmos, pois isso seria o começo de uma vida larga e nós a tememos. Temos evitado cair de joelhos diante do primeiro de nós que por amor diga: tens medo. Temos organizado associações e clubes sorridentes onde se serve com ou sem soda. Temos procurado nos salvar mas sem usar a palavra salvação para não nos envergonharmos de ser inocentes. Não temos usado a palavra amor para não termos de reconhecer sua contextura de ódio, de amor, de ciúme e de tantos outros contraditórios. Temos mantido em segredo a nossa morte para tornar nossa vida possível. Muitos de nós fazem arte por não saber como é a outra coisa. Temos disfarçado com falso amor a nossa indiferença, sabendo que nossa indiferença é angústia disfarçada. Temos disfarçado com o pequeno medo o grande medo maior e por isso nunca falamos no que realmente importa. Falar no que realmente importa é considerado uma gafe. Não temos adorado por termos a sensata mesquinhez de nos lembrarmos a tempo dos falsos deuses. Não temos sido puros e ingênuos para não rirmos de nós mesmos e para que no fim do dia possamos dizer "pelo menos não fui tolo" e assim não ficarmos perplexos antes de apagar a luz. Temos sorrido em público do que não sorriríamos quando ficássemos sozinhos. Temos chamado de fraqueza a nossa candura. Temo-nos temido um ao outro, acima de tudo. E a tudo isso consideramos a vitória nossa de cada dia.”
Alegria, tempo e solidão
"A alegria é a hora de relaxar, de transar, de se divertir. Na hora de alçar novos voos, crescer, é hora de ralar, quando você está com problema, com uns vazios. Se você só tem alegria, você não tem necessidade de crescer, de investir no crescimento. O grande sofrimento é que faz o homem empreender grandes jornadas na sua vida. Você vai tentar mudar se está tudo bem? Não. Não vai. Mas o que fazemos hoje? Vamos direto para a medicação psiquiátrica. (...) O nosso tempo convive demais! Para que a gente convive tanto? Vamos nos isolar mais! Temos que aprender a conviver com a gente mesma. Por que tem que ser aceito por todo mundo? Por que precisa ser famoso? Quem fica sozinho? Na internet talvez você fique. Por mais que esteja trocando conteúdo, está elaborando a sua solidão no seu blog. Temos que redescobrir a solidão, ter espaço para conviver até com a sua melancolia. Isso é bom. (...) Acho que todo mundo sente falta desses momentos, de contemplar, sentir. E sabe o que acho horrível? A pessoa que não consegue dar conta da sua própria vida e a “terceiriza”. Coloca o outro para cuidar. Isso é uma violência contra o outro. Uma violência grave."
Sobre Sociabilidades & Amizades
O perigo dos livros (?)
Lá na Lapa
P/ afastar a poeira dos dedos ou o nó da garganta
Penso que seja por aí... A verdade é que depois que aprendi a ouvir e a me interessar pelo que as pessoas dizem, nunca mais tive muito tempo para me preocupar com o “eu” do diálogo, com a minha parte nesse movimento de ir-e-vir, então acabo sempre por participar de um monólogo – o que me torna sempre uma companhia bem vista, acredito.
Quando mergulhei na literatura com mais afinco, lá pelos idos do fim da infância e começo da adolescência, acabei por acreditar que tudo o que eu sentia e poderia dizer já havia sido feito e que a prova estava justamente ali, nos romances e poemas que eu devorava a cada instante (pelas madrugadas em claro ou durante as aulas que eu não gostava) e que citava aos montes em trechos nas minhas falas ao longo das conversas com os amigos como se fosse o melhor que eu poderia fazer para participar, de alguma forma, um pouquinho do bate-papo.
Até hoje esse habito me acompanha, de certa forma, só que agora mentalmente. Quando estou em determinadas conversas e algo é dito, sempre ocorre da minha memória suscitar algum verso, alguma estrofe, parte de alguma música/poema/romance/livro que li. A fonte eu nunca lembro direito, sou capaz de confundir autores e obras por simples desatenção, não sacralizo autores ou obras, apenas as leio e me permito ser invadido por elas, ou não.
Dizer que agora essas coisas se tornaram mentais e silenciosas não significa dizer que tenho conseguido dialogar, somente significa dizer que não tenho citado mais, significa dizer que nem isso mais eu tenho tentado fazer. Tenho evitado até mesmo a tentativa de diálogo que se dava dessa forma. Dá um cansaço só de imaginar o desgaste que é discordar e ter de estruturar a discordância em palavras. Principalmente quando sabemos que tudo o que dizermos, por mais compreensível que possa ser, será questionado porque, no fim, as pessoas não vão querer aceitar que podem estar erradas ou que as coisas podem ter outros pontos de vista que também podem ser legítimos, sem que isso anule os seus próprios pontos de vista. Também pode haver um pouco de pretensão nessa minha atitude, confesso, de pensar que ninguém entende. Claro, não é possível entendermos algo que não foi explicado, sequer dito. É esperar pelo impossível...
Além disso, continuo com a impressão de que ninguém tá muito interessado em me ouvir, em te ouvir, somente em falar e ser ouvido. Não acho que eu seja lá muito interessante, o ou que eu possa dizer, e me canso muito facilmente quando percebo que estou falando demais, quando começo a ouvir minha própria voz enquanto falo. Pode ser que eu nunca tenha encontrado pessoas que achem o que eu falo interessante, a minha opinião relevante – ou demonstrem que elas são! – e o que falo (ou teria para falar) só pode vir do que eu vejo, do que eu leio, do que eu sinto...
Anyway... Estou com meu horário biológico todo atravessado. Não consigo dormir quando deveria (?) ou acordar no horário considerado normal (??). Meu colega aqui da república disse que eu entro em depressão nas férias/fim do ano porque minha vida gira em torno da faculdade. É bem verdade isso, não sei se quero ou poderia negar. Pois mesmo os amigos são, em suma maioria, oriundos da faculdade e, logo, saem da cidade quando de férias – muitos sequer são daqui ou se mudaram para cá devido os estudos na faculdade, como eu o fiz. E confesso que eu mesmo já teria saído da cidade se eu não estivesse trabalhando nessas férias por aqui. Mas acho que é mais do que isso, acho que é da rotina que mais sinto falta; da única rotina que sempre me acompanhou pela vida toda: a rotina “escolar”.
Eu, que há alguns posts atrás pedia por férias, não vejo a hora de ela acabar! Férias deveriam ser bimensais: a cada dois meses, uma semana de férias ou quinze dias, ou algo do tipo. Tenho uma montanha de textos para ler para escrever um projeto e um artigo, mas não encontro disposição; só funciono na pressão, com datas, prazos e cobranças. Senão... Faço como tenho feito: pego um livro de romance e leio duas páginas até pegar outro e ler somente a introdução e misturar com um artigo acadêmico que achei sem querer pela internet e que também não termino... Aí fico a navegar pela internet nessa péssima conexão que é a minha no momento, ouvindo músicas armazenadas no computador que nunca ouvi por excesso do que fazer, entrando no Facebook pelas madrugadas afora, enfim, louco de carência e solidão, desejando um diálogo que seja.
De bom, só o fato de que meu ano de 2011 foi inacreditavelmente incrível e que meu fim de ano tem sido menos doloroso do que costuma ser; tenho conseguido não me sentir tão mal como de costume nessa época. Tenho levado os dias até que razoavelmente bem. Claro, têm momentos em que caio num abismo – ou que acordo mergulhado nele! –, mas tem sido incrível como tenho conseguido me sair até que bem dele e prosseguido...
Décima elegia:
Lamento ter sido indiscreto
com minha dor e discreto com minha alegria. (...)"
Fabricio Carpinejar in: Terceira sede.
Encontros e Despedidas
Sei lá porque raios pensei nisso, mas é que o desejo de ser antropólogo tem conflitado com o desejo de voltar a ser tão somente aquele garoto que curtia ficar no seu quarto devorando os livros de literatura da biblioteca municipal.
Fica parecendo que a cada passo dado, já não há mais essa opção. (Como se o surgimento de uma identidade W em um determinado indivíduo destoasse de sua identidade anterior, de sua identidade Z - como se ser WZ não fosse possível).
Têm-se, daí, os ditos encontros & despedidas: como se encontrar algo de bom fosse também despedir-se de algo que também fora bom, mas que já não é mais compatível com o momento atual. Um epitáfio possível para essa situação seria: As coisas são simples na medida em que não são nada simples.
Minhas idéias versus Idéias dos outros
Pedir por férias, nesse momento, significa pedir pelo distanciamento desses outros que me/nos invadem repletos de teorias e discursos...
- O que é meu e o que é deles, desses outros que me invadem? O que são "minhas idéias", meu chão de pensamentos chão, e o que são "idéias de outros", chãos de pensamentos que não meus, mas no qual tenho transitado sem muita demarcação?
Pedir por férias é pedir pela retomada de decisão acerca do uso do (meu) próprio tempo. Quero usar do meu tempo para ficar "pasmando", pasmando e contemplando o nada e lugar nenhum; mover-me pelo simples motivo de me mover, sem que a isso eu dê (ou roube) o nome de ócio criativo...
A comunicação como invenção e pretensão
Sobre a "mercadoria-tempo"
Luto & Melancolia - Carta não datada
Tempo & duração
É tudo o que sou esse não saber ser
desencontrado
verbo, ação, tempo e lugar.
Esse vir a ser constante de inconstâncias,
Esse devir a me compor amontoado
de gestos entregues sem palavras.
A vida
um não ter sempre desejoso de vazios
Avulso
Tempo em que nada se sabia
Amor,
não faças muito barulho
ao entrar
podes acordar o tempo
que embala nossas vidas
como se tudo fosse
eternidade e encantamento.
No momento
Carta para você
"Tenho pensado em você quando tudo se silencia, quando tudo deixa de exigir urgência, a pulsão diminui, e não sinto mais a dor, não como antes. Tenho amado você aos poucos, sem pressa, sem alarde, sem explosões, e isso tem me modificado de algum modo.Meu amor, confesso, tem tempo certo, segue gestando-se pouco a pouco nesse coração sôfrego de lutas cotidianas. Meu amar necessita de elaboração para se construir certeza, requer estruturas sólidas, portos largos fixados em águas profundas, bases que me permitam fincar morada.Eu te amo em mim e meu amor é delicado, por isso não o ofereço a ti. Sou egoísta, admito, quero me permitir amar sem interrupções, sem possíveis negações; quero a magia da alegria crescendo a cada instante dentro desse corpo num acontecer inexplicável. Meu corpo te cabe por inteiro, meu corpo são poros abertos, sedentos, em busca de um complemento que só você é capaz de oferecer."
quântas-canta
de 1950
“Se você encostar em mim, sinto que não irei agüentar. Não irei suportar sentir seu toque fugaz e... Preciso dessa mínima distância para poder respirar meu próprio ar, alimentar-me de luz nascida do meu mais íntimo. Meu vício de você não fora algo que eu previra; quando percebi, já estava dada essa entrega sem amarras nem placas ou sinalização. As ruas túneis difusos, vielas bifurcadas de fluxos e confluxos de vocabulários próprios e distanciados do todo. Eu tenho bocas, mas não tenho a posse do eu, nem mesmo a voz da negação. Tenho veias, frutas secas e tinteiros, tenho vãos despertencidos borrões de loucuras sólidas razões imaculadas e putas. Colho os sonhos que você me deu. Os corpos, os corvos.”
Saber sofrer (?)
Em carta, você me perguntou pela felicidade, mas preciso, em resposta, escrever sobre o sofrimento. Talvez eu os veja como interdependentes, como componentes simbióticos de um sonho coletivo. Isso que convencionamos chamar de realidade. Uma ilusão. Uma desilusão. O que mais poderia nos livrar do sofrimento se não a percepção do mesmo como parte integrante de um círculo natural ao ser humano? Sofremos por estamos vivos. Nossa outra opção seria não sofrer, ou seja, não mais viver – a vida em sua plena intensidade de jogo de forças que se sobrepõem, a todo instante, a nós. Portanto, cabe-nos constantemente reinventarmos o sentido da vida, já que o mesmo não se encontra dado, descobrirmos valores que justifiquem o sofrimento, o entendimento deste como um momento não definitivo, mas fundamental para o crescimento, para uma completa expansão no mundo.
Resquícios confessionais
Abortei o amor na clandestinidade dos excluídos, dos subversivos, dos exilados frente à própria felicidade. Não tinha direito a tanto, a tudo; o direito de governar-me nunca me fora entregue bem como as chaves do deserto de peles com que me cubro, e não me cabem. Abortei as faltas que, talvez, não me caibam como quem reduz ao pó a própria inexistência do grito a procura de alento. Os excessos presos a garganta um nó de palavras símbolos e signos, corroboradas em cartas extraviadas na imensidão do afeto sepultado. Ao morto, duas moedas de prata sobre os olhos, o devido.
Última carta ou Carta-profética
– Introdução
As formas de loucura sem sentido
Às vezes tenho vontade de fazer as malas e partir, mas só ás vezes é que tenho essa vontade de ser eu mesmo; em geral fico quieto e obstinado, obedecendo ao jogo flutuante aceito veladamente no exato momento do embarque. Houve a partida sem despedida e a percebi no momento em que olhei para trás e o passado já não estava mais no lugar que eu acreditei que devesse estar.Tudo é muito confuso para ser descrito, ainda mais em cartas fantasmas, sem destinatários ou datas. Enviarei a você, que sou eu na medida em que lê o que escrevo, na medida em que me lê, os trechos que ainda me constituem forma e força, as pistas deixadas ao acaso, para o caso de alguém decidir procurar por mim, e você, por aí.
Perambulando
...Mas você não estava lá;
E era tudo o que eu sabia: que você não estava. Se ao menos eu possuísse a certeza de que um dia havia estado, talvez pudesse repousar entre os abraços não recebidos. Mas já não estava lá; o laço desfeito, a dúvida perdida. Apenas esses fragmentos, caídos ao chão, os velhos retratos de momentos passados, e as letras de vivências destroçadas por sobre as paredes brancas. As chuvas de outono. As mágoas.
Devaneio
Clément Rosset diz que o homem tem uma enorme capacidade de sentir, mas uma mínima capacidade de suportar o que sente. Quem sabe seja isso, quem sabe a falta se chame felicidade. O que pode ser a felicidade que não espaços absolutos em meio à infinidade de constâncias cotidianamente inexpressivas? Espaços absolutos de alegria, de bons encontros, diria Spinoza, de pura revelação, insight, epifania.
Mas o que sei eu sobre tudo isso, sobre felicidade, encontros, Spinoza ou Clément Rosset? Eu que sou apenas mais um tentando sobreviver, ou melhor, tentando desvendar a capacidade humana de ir além da sobrevivência e viver. O que sei? a não ser que tudo isso custa caro, custa muito cara a guerra contra o (des)conhecido inominável?
ausente-presente
e do medo de não estar mais tão ausente-presente
cartas aos náufragos
As imagens me acompanham; meu espaço à deriva.
Li um livro recentemente que me deixou muito triste, e feliz.
Depois posso até reflexões que expliquem
porque o sofrimento, na arte, permite o prazer.
Nietzsche, quem sabe também Schiller...
Schiller não caberia aqui, no momento
eu é que deveria caber. No entanto não consigo transparecer.
Camadas e mais camadas...
Cal onde nem chuvas de janeiro nem desembocamento
de rios em mares conseguiram desmanchar.
Fiz pesquisa e descobri muito do desconhecido.
Óxido de cálcio: substâncias das mais importantes
para a indústria, utilizado na construção civil para preparação
de argamassas que erguam paredes e muros
da minha vida. possuo os muros e as entranhas, firmes.
Essas resistências que por tantas vezes me sufocam
e não sei como evitar. Fiz pesquisa para saber, para que saiba.
Que talvez eu não seja tão ingênuo, não;
Que talvez o amor não me queira. na palma de suas mãos
Se conto, é para que saiba:
Já não escondo tanto mais a minha dor. Se eu estiver sangrando.
Amor
nos quintais de terra e luz,
nos vales e sons,
no tom de cânticos e preces,
no tempo do adeus.
nas memórias entrecortadas,
nas rezas, nas brechas, nos vãos
e abismos sufocados em esperas
ou mesmo Deus: nada
ousou nos traduzir.
(Outono de 1964)
carta naufragada: bilhete redescoberto*
Parte II, Indagações:
quem cuidará das minhas dores inomeáveis
e me estenderá as mãos quando nada mais fizer sentido?
me reensinará o caminho rumo ao futuro incerto
onde tudo se fará como da primeira vez
nunca ocorrida...
(* entre as caixas de Pillar, bilhete datado de 1920)
Uhmam
as carnes
desprendendo
os ossos
desprendendo
o corpo
ácido
corrosivo
inverno
venoso
aniquilamento
fértil
solo
Humano.
Carta a quem sou quando não palavra
da janela se vê. o interno-outro: nebulosidade e mistério.
desconhecidos. rios a se formar por sobre o chão.
onde não piso. é maio e não tenho medo. do futuro.
uma paz desconhecida a irromper da carne.
pega minhas mãos e acalma. sua angustia
como se um corpo a dividir. sem pressa,
nossa canção eclode das águas e flui – em meu avesso.
por entre pedras e lama. a confirmação de nossos dias
entrega. porque você nunca me economiza. exiges,
inclusive, as entranhas do sentimento ainda não acontecido.
nascendo de dentro de mim sem explicação. há todo um
gesto e jeito próprio de ser.
e não sei se transbordo ou seco. ser líquido ou represa
não sei se líquido ou represa. meu lugar nesse estancar
entre moradas e esquecimentos. me diz (?) porque
eu simplesmente me entrego.
(imagem da série 'Aqueous', do fotógrafo britânico Mark Mawson)
Carta feito tatuagem
essa facilidade p'ra viver
_____________________a vida sem sequer pensá-la
ponho pelo avesso antes de ousar decidir trajeto,
sair de casa e deixar as coisas acontecerem. Ou não.
A ordem prática em relação às coisas é algo que me falta.
Tenho uma estranha disposição para a complicação.
O fazer de algo simples se torna subjetivo:
preciso de bulas detalhadas que me expliquem
possibilidades; de como posicionar pontos finais ou agir
mediante a desvios, vírgulas de percurso e sensações em forma de sentidos. Sonetos que traduzam. minha obsessão
por letras, signos, tinta e grafia. Sua caligrafia fica. desenhada
por sobre o corpo, tatuagem a me redirecionar a você. em mim.
sentimentos subterrâneos
(trecho retirado do livro 'O habitante das falhas subterrâneas', de Ana Paula Maia, que pode ser lido virtualmente clicando aqui.)
em outros espaços
Na rua em que perdemos os nomes,
'Pra declarar minha saudade'
Fiz uma canção pra declarar minha saudade
Do tempo em que a alegria dominou meu coração.
Eu era bem feliz, mas desabou a tempestade
Levando um lindo sonho pelas águas da desilusão.
Eu fiz uma canção pra declarar minha saudade,
Usei sinceridade que me dá certeza que você
Quando ouvir, o meu cantar, vai se lembrar que deixou
Do lado esquerdo do meu peito essa dor,
Que tá difícil de curar...
Tenho certeza que você, de onde ouvir,
Meu soluçar em forma de uma canção,
Vai se lembrar que nosso amor é tão bom,
E que pra sempre vai durar.
) Jr. Dom / Arlindo Cruz (
*Para Heitor,
*Publicado originalmente em 24 de abril de 2009.
desembrulhar presentes vazios
Onde andará segredado o verdadeiro mistério só alcançável pelo conhecimento?
Preciso dormir, insônia em demasia esquece de sentir; sentidos.
Piada de dois ou desvendando complicações
'Dialética'
É claro que a vida é boa
E a alegria, a única indizível emoção
É claro que te acho linda
Em ti bendigo o amor das coisas simples
É claro que te amo
E tenho tudo para ser feliz
Mas acontece que eu sou triste...
) Vinicius de Moraes (
Desnós
Descobri não invejar os mais jovens do que eu;
não almejar a juventude eterna;
não lamentar não ser testemunha do futuro;
(Se bem que estou jovem e isso talvez possa explicar as coisas, ao menos por hora...)
playlist - na praia:
Luciana Mello;
Emilio Santiago;
jazz ao vivo;
durante a tarde inteira... tranquila e bem agradável
Constatações - na praia:
pessoas feias reunidas democratizam;
espaço público não é considerado público;
só há igualdade entre iguais;
o autoritarismo auditivo impera;
e o silêncio é espécie em extinção;
no lugar
para onde foi tudo o que se apagou independente da nossa vontade? em que local é possível o depósito de todos os amores passados e que, uma vez terminados, esquecidos, soterrados pelas novas sensações e emoções, jazem inexistentes?
tento entender término tanto quanto início. e todas as promessas ditas e firmadas em pactos vazados, sem sentido... mas só compreendo o que posso tocar.
mar do norte
enquanto houver dia, posso acreditar na luz, na esperança, no renascimento e descoberta. a noite espreito, cuido para que não dure mais do que seu tempo necessário para o equilíbrio.
nuvens claras como espumas e sonhos em ondas singelas. a verdade é que preciso de rio mais que de mar; preciso de uma direção para onde correr.
epitáfio:
Disse a frase acima ao Chico Ribas, cara que admiro há um tempo já pelo que escreve, como escreve e atua (nos curtas que vi com ele); é do tipo de cara que dá vontade de ser amigo gratuitamente. Acredito mesmo que seja verdade, o que disse a ele; pelo menos por enquanto...
o nada e suas opiniões
nasci engraçadinho antes mesmo de sê-lo. é o que dizem os sem palavras.
não tenho o que dizer mas digo como se não tivesse o que dizer estando dito todas as coisas que jamais disse. ou algo que faça sentido e que não tenha sido explicitado.
e prendi tem pouco tempo a não exigir muito. auto-estima é uma merda! fracasso também. o politicamente correto sai logo dizendo que se aprende com as perdas. prefiro aprender com os ganhos e lucrar com eles.
na verdade não prefiro nada. opiniões sobre o nada. e tudo isso porque não tenho o que dizer mas insisto em fazê-lo.
polpa, um poema
o sal que põe em minha boca
tem gosto adocicado,
febrífugo para feridas
em processo de cicatrização.
minhas veias dançam
minhas mãos
arraigadas no solo
que um dia há de acolher
o descanso do que fui.
invento nomes, semeio sonhos,
rugas em processo de gestação
infinitamente amanhecendo
sobre o deserto que me veste
ao te receber
no abraço de um corpo plantado
na pulsação de horas
a conceber vidas e mortes. em ciclos.
dentro do meu peito
embarcações e navios fantasmas
divagar é preciso
Escrever é momento de vivências. Resolvi abrir os poros e permanecer pronto, a espera de quando a escrita vier junto as experiências (da memória) – mas isso não quer dizer que deixo ao acaso, faço minha parte...
____________caminho ao longo do canal. e escrevo longas cartas pra ninguém, como na canção da Adriana Calcanhotto e do Antônio Cícero. Enquanto aguardo o inverno, entre o ontem e o hoje, vivo minhas divagações...
Toda questão
(mas tem de ter sentido?)
(tem lado inverso?)
Sobre sumiços passados e futuros
Se eu pudesse, eu nada seria, mas tenho descoberto o quanto é o desconhecido. Retorno na esperança de me encontrar com o outro que não sou, mas que, quem sabe um dia, eu possa sê-lo.